Criado: Quarta, 21 Agosto 2024 10:14
Natália Wagner destacou que comunidades amazônicas são invisibilizadas pelas políticas públicas diante das mudanças climáticas, e o palestrante Ruy Marcelo abordou os desafios da crise climática e desastres ambientais na Amazônia
Dando continuidade à programação do Seminário Internacional sobre a Proteção da Amazônia, na tarde desta terça-feira (20), foram abordados os temas “Racismo Ambiental” e “Enfrentamento da Crise Climática e Prevenção de Desastres na Amazônia”, conduzidos, respectivamente, pela bióloga Natália Wagner e pelo procurador de Contas Ruy Marcelo.
Durante sua exposição, Natália Wagner, juntamente com os debatedores Eduardo Saad (USP), Afonso Mosquito Garrido (Uni Jean Piaget) e João Gianechinni (USP), ressaltou o quanto as comunidades amazônicas, como povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos, são invisibilizadas pelas políticas públicas e como essa marginalização se agrava em face das mudanças climáticas. “Essas populações são as que mais sofrem com os eventos climáticos extremos, como as secas severas, que deixam essas comunidades completamente isoladas, sem acesso a necessidades básicas, como alimentação e água“, alertou.
Natália Wagner destacou ainda a urgência de políticas públicas que incluam essas comunidades em programas de educação, saneamento básico, geração de oportunidades e renda. Para a bióloga, o racismo ambiental e o emergente conceito de racismo climático são expressões do mesmo problema: “Se daqui a 25 anos ainda estivermos discutindo racismo ambiental como estamos hoje, isso significa que falhamos como sociedade civil e acadêmica“, afirmou.
O professor angolano Afonso Mosquito Garrido trouxe uma perspectiva global ao debate, comparando a situação da Amazônia com a realidade africana. Segundo o professor, o Brasil tem a chance de evitar os erros cometidos na África, onde políticas públicas inadequadas e a exploração desenfreada levaram à destruição de ecossistemas e ao sofrimento de populações tradicionais.
“Estamos destruindo o nosso planeta, e as populações da Amazônia, que já sabem conviver naturalmente com a natureza, são essenciais para a proteção dessa biodiversidade. As políticas públicas precisam respeitar seus hábitos e costumes. O Brasil ainda tem tempo de reverter esse problema que afeta o mundo de forma tão agressiva“, completou Mosquito.
O que é Racismo Ambiental?
O racismo ambiental é um conceito que denuncia a desigualdade na distribuição dos impactos ambientais, que afetam de maneira desproporcional as populações marginalizadas e minorias étnicas. Na Amazônia, essa discriminação se manifesta na falta de saneamento básico, no despejo de resíduos tóxicos em áreas vulneráveis, na grilagem e na exploração de terras pertencentes a povos tradicionais. Essas práticas reforçam a exclusão social e intensificam a degradação do meio ambiente, tornando essas comunidades as principais vítimas das catástrofes climáticas.
Crise climática na Amazônia
Encerrando o segundo dia de seminário, o procurador de Contas e professor Ruy Marcelo abordou os desafios da crise climática e desastres ambientais que a Amazônia enfrentará. “A situação da Amazônia é complexa. Antes de analisarmos a prevenção de desastres e a mudança do clima, é necessário compreender a Amazônia como um mosaico de ecossistemas naturais, onde o fluxo migratório se mistura com os povos tradicionais e originários, gerando, muitas vezes, conflitos culturais. De um lado, temos o conhecimento milenar desses povos que aprenderam a cultivar essa floresta; de outro, migrantes que veem a floresta como um obstáculo a ser superado para o desenvolvimento através da pecuária e agricultura”, explicou.
Ruy Marcelo destacou que essa visão de desenvolvimento que desconsidera as particularidades do bioma amazônico tem consequências devastadoras. “A Amazônia, que poderia ser a solução dessa crise climática, se torna sua primeira vítima com o aquecimento, as queimadas, as secas severas e as enchentes extraordinárias. O bioma está febril, contaminado, correndo o risco de não realizar mais os serviços ecossistêmicos que garantem condições de produção e bem viver no continente sul-americano. Precisamos agir de maneira sustentável e rápida, pois a ameaça é muito grande“, enfatizou.
Ruy Marcelo também chamou atenção para a situação alarmante do Rio Negro, um dos principais afluentes do Amazonas. “O Rio Negro está bem abaixo da média de vazante registrada historicamente, indicando que estamos diante de uma nova realidade de secas severas que vieram para ficar. E nós não temos um plano de adaptação, não temos um plano de resiliência capaz de atender a essas demandas. O que vamos fazer? Condenar nossos municípios ao isolamento, à condição inferior de vida? Não podemos. Para contornar essa situação, é necessário dinheiro e suporte tecnológico“, alertou.
Além de membros, o evento contou com a presença de estudantes da escola CMPM VIII (Escola Estadual Coronel Pedro Câmara), oportunizado pelo projeto “MP nas Escolas”. O público acompanhou a programação por meio de tradução simultânea de libras.
Terceiro e último dia
O terceiro e último dia de seminário acontecerá nesta quarta-feira, 21 de agosto, com programação até as 14h da tarde. De manhã, às 9h, será debatido o tema “Ministério Público, Investigação Criminal e a Proteção das Futuras Gerações”, com o painelista Finn Schimidt (Alemanha). Às 10h45, será a vez de discutir o tema “Servidão Moderna e Desmatamento”, com João Gianechinni (USP). Às 14h, ocorrerá uma mesa-redonda, moderada pelo promotor de Justiça João Gaspar, finalizando com a assinatura da carta de compromisso.
Veja mais imagens do evento no Flickr do MPAM.
Texto: Poliany RodriguesFoto: Hirailton Gomes