Auxílio foi criado em caráter provisório e valor já pago daria para construir de 200 a 300 moradias
MANAUS – Três anos após a reintegração de posse na área que ficou conhecida como ‘Monte Horebe’, na zona norte de Manaus, R$ 34,2 milhões foram destinados pelo Governo do Amazonas para pagamento de auxílio-moradia a 2,2 mil famílias retiradas do local. O benefício, que era pra ser provisório, gera despesa mensal de R$ 1,3 milhão ao estado.
De acordo com levantamento feito pela reportagem do ATUAL com base em informações do Portal da Transparência do Amazonas, do valor que já foi pago, R$ 13,1 milhões ocorreram em 2020, R$ 17,1 milhões em 2021 e R$ 3,9 milhões até o mês de abril deste ano. Até o fim do ano, a expectativa é que o estado destine mais R$ 10,4 milhões para os beneficiários.
O auxílio-moradia, no valor de R$ 600 para cada família, começou a ser pago em março de 2020, quando as famílias foram retiradas da invasão. O benefício é uma das condições previstas no acordo firmado entre a DPE-AM (Defensoria Pública do Amazonas) e a Suhab (Superintendência de Habitação do Amazonas) na Justiça em fevereiro de 2020.
De acordo com o documento, para realizar a reintegração de posse da área ocupada irregularmente, o Governo do Amazonas proporcionaria “moradia adequada às famílias” através do “instrumento que se apresentar mais adequado para cada caso, de forma gratuita ou onerosa, desde que cumpridos os requisitos legais”.
O acordo cita a possibilidade de o Governo do Amazonas pagar a cada família “auxílio-aluguel, na quantia de R$ 600,00 mensais, por tempo determinado, a ser especificado individualmente”. Também estabelece que o benefício será encerrado “tão logo seja oportunizada solução de moradia ao beneficiário”.
O defensor público Rafael Barbosa, que participou das negociações com a Suhab para retirada das famílias da área, afirmou que a DPE-AM entrou no caso para evitar violência contra os ocupantes do local, como tem ocorrido em reintegrações de posse de áreas em todo o país. “As pessoas são retiradas e ficam sem ter pra onde ir”, afirmou o defensor público.
De acordo com Barbosa, a DPE-AM sugeriu o pagamento do auxílio-moradia como uma alternativa para retirar os ocupantes da área sem deixá-los “ao léu, desguarnecidos”. Segundo ele, o benefício seria uma solução de moradia provisória, até que o governo estadual providenciasse uma solução definitiva.
“A ideia era que aquelas pessoas seriam cadastradas e receberiam o aluguel social, um auxílio aluguel, durante um determinado período até que o estado oferecesse para elas uma solução definitiva de moradia, seja através de casas populares ou outras possíveis práticas pra resolver esse problema que é um problema crônico no Amazonas”, disse Barbosa.
O defensor público afirmou que não sabe o motivo pelo qual “aquela solução que seria provisória se estendeu deu como definitiva”. Segundo ele, cabe à DPE-AM apenas fiscalizar o acordo, acompanhando a execução dele para saber se as pessoas cadastradas estão recebendo auxílio do estado, seja através do benefício ou de moradias.
“E o acordo diz que enquanto não der uma solução definitiva o pagamento do auxílio se prolonga, se perpetua no tempo. E o papel da Defensoria é cobrar a favor das pessoas que foram cadastradas, que depois de um uma avaliação social ficou constatado que elas têm os requisitos que colocam elas no rol daquelas pessoas vulneráveis”, disse Barbosa.
Políticas públicas
Para o engenheiro civil Robson Ferreira, apesar de a concessão do benefício ser uma forma de política pública para a questão habitacional, deve ser implementado de forma emergencial, com caráter provisório, e “não pode se perpetuar, sem que haja um programa para resolver, de forma definitiva, a questão”.
Para Ferreira, a solução do problema depende da “instauração de políticas públicas no ramo habitacional, onde os governos criem programas que atendem a crescente demanda por moradias”. Além da regularização de ocupações clandestinas, o engenheiro cita a desapropriação de imóveis abandonados e a destinação deles para programas habitacionais.
“Isso requer a regularização fundiária, o pagamento de aluguel social, a desapropriação de imóveis abandonados e destinação deles para programas habitacionais e a disponibilidade de crédito acessível às famílias”, afirmou Ferreira, que coordena o Grupo de Trabalho de Obras Públicas do Crea-AM (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Amazonas).
De acordo com o engenheiro, com o valor destinado pelo Governo do Amazonas para as famílias retiradas da invasão Monte Horebe nos três anos daria para construir de 200 até 300 moradias na capital amazonense. Segundo ele, essa medida não resolveria a questão de todas as famílias, mas representaria o reassentamento de parte delas.
O engenheiro explica que o déficit habitacional envolve tanto a falta de moradias para a população quanto a existência de moradias inapropriadas, que apresentam deficiências. “Isso é um problema crônico no Brasil, pois dados divulgados em 2021 mostram que o déficit de habitações chega a quase 6 milhões no país”, afirmou Ferreira.
“Quando se amplia isso para as moradias em precárias condições, chegamos ao alarmante número de quase 25 milhões. Ou seja, quase a metade da população brasileira tem habitações com alguma deficiência”, completou o engenheiro.
Questionado pela reportagem sobre as medidas que estão sendo adotadas para solucionar definidamente os problemas habitacionais no Amazonas, o Governo do Amazonas informou que “trabalha num planejamento para viabilizar soluções de moradia dessas famílias priorizando a situação de vulnerabilidade de cada família”.