Oficial de registro havia suscitado dúvida em relação ao mandato vitalício ou indeterminado do diretor da organização religiosa.
A 1.ª Vara da Comarca de Iranduba proferiu sentença em que julgou improcedente dúvida suscitada por oficial de registro e determinou que seja feito o registro da ata de assembleia de fundação, eleição e posse da organização religiosa Centro Espiritualista Universalista Fraternidade Flor Divina.
A decisão data de terça-feira (08/11) e foi proferida pela juíza Aline Kelly Ribeiro Marcovicz Lins, no processo n.º 0200741-76.2022.8.04.4600, em consonância com o parecer do Ministério Público.
Na ação, o oficial do 2.º Ofício da Comarca suscitou dúvida em razão do artigo 14 do Estatuto do Centro Espiritualista, cuja assembleia de constituição foi apresentada para registro, e dispõe que o cargo de diretor espiritual será ocupado por tempo indeterminado ou vitalício, sendo irremovível e soberano.
Para o oficial, isso afrontaria o disposto no artigo 396 do Provimento n.º 278/2016, da Corregedoria-Geral de Justiça, segundo o qual, “quando da apresentação do ato constitutivo de pessoa jurídica de fins não econômicos, deverão ser juntadas a ata de fundação e a de eleição e posse da primeira diretoria, essa devidamente qualificada e com mandato fixado, não se permitindo mandato ou cargo vitalício”.
De acordo com a magistrada, a norma visa a “evitar a constituição de entidades sem rotatividade de representação, o que é sadio para o exercício das atividades gerenciais e decisórias das pessoas jurídicas”.
Mas o posicionamento não pode ser o mesmo ao se tratar de organização religiosa, pois o dispositivo cinge-se a regulamentar somente àquelas pessoas jurídicas elencadas como sem fins econômicos previstas nos incisos I e III do artigo 44 do Código Civil, segundo a juíza.
Conforme o artigo 1.º do Estatuto do Centro Espiritualista, a organização tem como natureza jurídica se constituir em organização religiosa, embora também seja sem fins econômicos.
A magistrada destaca que a Constituição Federal prevê em seu artigo 5.º, inciso VI, que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
“Portanto, é possível que o cargo de diretor espiritual possa ser ocupado por prazo indeterminado ou vitalício. Interpretação diversa do provimento supracitado ensejaria violação à garantia constitucional de liberdade de crença e religião, o que não se pode admitir em nosso ordenamento jurídico”, conclui a juíza Aline Lins.
Patrícia Ruon Stachon
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