Realizada por iniciativa do Núcleo de Governança Fundiária e Sustentabilidade (NGFS), da Corregedoria-Geral de Justiça do Amazonas, a audiência ocorreu na manhã de quinta-feira.
Na manhã de quinta-feira (20/06), a Corregedoria-Geral de Justiça (CGJ/AM), por meio do Núcleo de Governança Fundiária e Sustentabilidade (NGFS), promoveu audiência pública do Programa “Solo Seguro – Favela” que reuniu instituições públicas, líderes indígenas e a comunidade do Parque das Tribos, no Tarumã-Açu, zona Oeste de Manaus, para tratar do tema “Reconhecimento extrajudicial das ocupações urbanas por indígenas”.
A ação cumpre diretrizes do Provimento n.° 158/2023, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que criou o movimento nacional pela regularização fundiária de ocupações irregulares nos centros urbanos – espaços popularmente conhecidos como “favelas”.
Essa é a primeira de um conjunto de audiências públicas que serão realizadas na capital para fomentar a regularização e orientar projetos para melhorar a infraestrutura da cidade de Manaus, enviando notas técnicas do Núcleo de Governança Fundiária e Sustentabilidade (NGFS) ao poder público, após a manifestação dos interessados em tais eventos.
O “Parque das Tribos” reúne famílias de várias etnias, como Cocama; Deni; Sateré-Mawé; Tukano; Dessana; Tuiuka; Tariano; entre outros, e foi reconhecido pelo poder público municipal, há mais de dez anos, como o primeiro bairro indígena em área urbana.
A audiência pública foi iniciada pelo subcoordenador do NGFS, o juiz-auxiliar da CGJ/AM, Áldrin Henrique de Castro Rodrigues, que, após abrir oficialmente o evento, passou a presidência para o cacique Israel Mundurucu, um dos líderes da comunidade.
“O ‘Parque das Tribos’ é o primeiro bairro indígena do Brasil, talvez a maior diversidade étnica cultural do País com a maior comunidade de indígenas não aldeados do mundo, mais de cinco mil pessoas. Com essa audiência o ‘Parque das Tribos’ recebe do Tribunal de Justiça o reconhecimento de ser a comunidade indígena tradicional, que preserva seus costumes, sua cultura e suas línguas, porque aqui nós falamos mais de 20 idiomas diferentes”, disse o cacique. Segundo ele, a renda da comunidade é gerada pelo artesanato produzido com sustentabilidade na área que é rodeada pelo rio Tarumã e que ainda é uma área preservada por eles, onde as famílias se alimentam, pescam e se banham. “Preservamos nossos costumes, mesmo inseridos em contexto urbano, sem uma etnia influenciar a outra, porque cada um tem seu idioma, as tradições na forma de fazer e consumo do alimento e forma de tratar, da mesma maneira que é feito nas comunidades indígenas”, explicou o cacique Israel Mundurucu.
O cacique chamou atenção para a importância da audiência pública do “Solo Seguro – Favela” se estender para as outras comunidades indígenas estabelecidas em áreas urbanas de Manaus e entorno, que são mais de trinta e que não foram contempladas com o reconhecimento do poder público como bairro indígena, mas permanecem preservadas com seus dialetos, costumes e cultura.
Durante o evento os caciques, como forma de agradecimento pela iniciativa, presentearam o juiz Áldrin com um cocar confeccionado pela comunidade.
Além do contexto da regularização fundiária, a audiência pública trouxe temas correlatos dentro da proposta, como a infraestrutura, preservação de cultura e as tradições indígenas como princípio de incentivo às políticas públicas de acesso aos serviços essenciais e à cidadania, segundo o juiz corregedor auxiliar, Áldrin Henrique de Castro Rodrigues, que salientou a importância da Justiça ouvir a população.
“A expectativa é de se formular um diagnóstico amplo acerca das dificuldades experimentadas pelos povos originários que habitam a maior parte da área dos núcleos urbanos informais. O detalhe importante é ouvi-los, as instituições precisam aprender a ter um protocolo de atendimento a esses povos e é ouvindo que vamos aprender a construir uma Justiça que mais se aproxima, de fato, de um contexto social positivo, de modo a respeitar as tradições, costumes e anseios dessas populações”, avaliou o magistrado.
A representante da Associação dos Notários e Registradores do Amazonas (Anoreg/AM), Thais Batista Fernandes, esclareceu para a comunidade indígena pontos da regularização fundiária.
“É importante a gente analisar quanto tempo a pessoa está na posse do imóvel, as benfeitorias que foram realizadas, quanto tempo ocupa a área. Mas hoje temos à disposição uma gama de instrumentos jurídicos que podem auxiliar na regularização dessa terra. Precisamos fazer uma diferenciação entre tipos de ocupação: a demarcação da terra é uma garantia constitucional das terras, dos imóveis que os povos originários têm e precisam dessa proteção e demarcação da União. Todavia, isto não impede que o município possa titular áreas em favor dos povos originários, e eles estarem nos perímetros urbanos não significa renúncia aos costumes e tradições porque, essa identidade cultural também é um patrimônio histórico do nosso País e os identifica socialmente”, explicou a representante da Anoreg/AM, salientando que um dos caminhos para a regularização é a Lei n.° 13.465, de 2017, conhecida como REURB, um conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes.
“Para que a cultura desses povos seja preservada é preciso dar essa segurança jurídica e é o que este encontro aqui hoje objetiva. A Defensoria Pública do Estado está se colocando à disposição com a experiência que temos junto às comunidades indígenas no interior do estado, e hoje na capital também, para auxiliarmos na produção desse procedimento de regularização fundiária extrajudicial porque é mais simples, mais rápido e a legislação permite”, disse o defensor público, Antônio Albuquerque,
O professor Bianor Saraiva Nogueira Júnior, Doutor em “Sociedade e Cultura na Amazônia” pelo Programa de Pós-Graduação – PPGSCA da Universidade Federal do Amazonas – e professor de Direito Indígena na Universidade Estadual do Amazonas, avaliou que ações feito as que vêm sendo desenvolvidas pelo NGFS e a união de esforços das entidades públicas podem mudar a feição urbana, criar impacto ambiental e distribuir cidadania.
“Na minha tese de doutorado eu trato do que eu chamo de ‘convergência de institucionalidades’, para a resolução de problemas complexos, ou emergências sociais complexas. Essas ações, envolvendo várias instituições podem resolver problemas complexos em curto e médio prazo”, disse.
Estiveram presentes também ao evento uma das lideranças da comunidade, Vanda Witoto; caciques representantes das várias etnias que integram o “Parque das Tribos”; asubsecretária Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários (SEMHAF), Zuldy Bonates; o professor Brychtn Ribeiro de Vasconcelos, Doutor em Direito (“Direito e Justiça”) pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG e que integra o NGFS; além de estudantes e servidores das instituições públicas presentes ao evento.
Sandra Bezerra
Foto: Marcus Phillipe
Revisão textual: Joyce Desideri Tino
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