Além do empresário, também foram sentenciados a mãe, uma tia e um irmão da vítima.
A Juíza de Direito Dinah Câmara Fernandes Abrahão, Titular da 1.ª Vara de Crimes contra a Dignidade Sexual e de Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes (1.ª VCCDSVDCA) do Tribunal de Justiça do Amazonas, sentenciou um empresário de nacionalidade alemã a 30 anos de prisão por estupro de vulnerável e favorecimento à prostituição, em caso que teve como vítima um menina amazonense.
Na mesma ação penal, três familiares da vítima foram sentenciados por contribuírem com as práticas criminosas: a mãe da criança foi condenada a 14 anos de reclusão, pois, conforme a denúncia ofertada pelo Ministério Público do Amazonas, “mediante obtenção de pagamentos em dinheiro por parte do denunciado (o empresário alemão), concorreu para que este permanecesse mantendo conjunção carnal e praticado outros atos libidinosos” com a vítima; e a tia e o irmão da vítima foram sentenciados a sete anos e seis meses por favorecimento à prostituição.
De acordo com os autos, os crimes ocorreram entre os anos de 2013 e 2022 nos municípios de Novo Airão e Manaus. A sentença foi disponibilizada na segunda-feira (24/06), no Diário da Justiça Eletrônico (DJe), e determina a prisão do empresário alemão e ex-marido da tia da vítima; e da mãe desta para o cumprimento da pena em regime fechado. A pena aplicada à tia e ao irmão deverá ser cumprida em regime semiaberto.
Todos os quatro sentenciados também deverão pagar indenização à vítima a título de danos morais. Além disso, no caso dos três réus com parentesco em relação à ofendida, a sentença determina a perda do poder familiar, visando à proteção integral da adolescente.
Em relação às indenizações por dano moral, o Juízo da 1.ª VCCDSVDCA fixou que o empresário deverá pagar o valor de R$ 50 mil à ofendida; a genitora, o valor de R$ 20 mil; já para a tia e para o irmão, o valor fixado foi de R$ 20 mil e R$ 10 mil, respectivamente.
O crime
Conforme os relatos da vítima em sede de depoimento especial, os abusos, por meio de atos libidinosos, começaram quando ela tinha 6 anos e morava com o empresário e a tia (então mulher do réu) em Novo Airão, após o casal tê-la retirado de um abrigo. Ao completar 12 anos, o denunciado passou a manter conjunção carnal com ela. De acordo com a denúncia formulada pelo Ministério Público, a vítima conheceu a mãe biológica aos 13 anos e passou a morar com ela em Manaus. Ao ser informada pela filha sobre os abusos, a mãe resolveu obter proveito econômico da situação e propôs ao empresário que lhe fizesse pagamentos em dinheiro pelo silêncio e para que pudesse viabilizar a continuidade da prática dos abusos contra a vítima, o que aconteceu a partir de 2021 até 2023, quando a menina era enviada à casa do acusado, em Novo Airão.
Ainda segundo a denúncia, nesse mesmo período de 2021 a 2023, a mãe passou a obrigar a filha a manter relações sexuais com outros homens, em motéis da capital, para angariar dinheiro para a família. A menina era agredida pela mãe, com a ajuda do irmão, ao ser obrigada a realizar os encontros.
Os abusos só cessaram quando, ao completar 15 anos, a vítima , com a ajuda de uma tia paterna, resolveu denunciar os fatos na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente.
A denúncia do Ministério Público, com base no inquérito policial, foi recebida pela Justiça em julho de 2023. Naquele mesmo ano, o Ministério Público do Estado pediu a prisão preventiva do empresário estrangeiro (que ainda se encontrava no Brasil) e da genitora da vítima, que está custodiada desde então. O empresário deixou o Brasil antes do cumprimento do mandado de prisão expedido pela Justiça, e quando foi interrogado, por videoconferência, na fase de instrução processual, já era considerado foragido.
Conforme o Juízo da 1.ª VCCDSVDCA, em razão do processo que tramita na Comarca de Manaus, o réu encontra-se preso na Alemanha, e a Justiça daquele País vem acompanhando a tramitação do caso na Justiça amazonense por meio de procedimento de Cooperação Internacional com o Ministério das Relações Exteriores do Brasil. A Carta Fundamental alemã não permite a extradição de seus cidadãos.
Presa preventivamente em Manaus desde 28/05/2023, a mãe da vítima deverá cumprir a pena de 14 anos de reclusão em regime inicial fechado, sem direito de recorrer da sentença em liberdade.
A tia (que é ex-mulher do empresário estrangeiro sentenciado) e o irmão mais velho da ofendida cumprirão a pena em regime semiaberto.
Para o Juízo da 1.ª VCCDSVDCA, a materialidade do crime de estupro de vulnerável e de favorecimento à prostituição ficou demonstrada “por tudo que consta do inquérito policial e o que foi produzido em Juízo, em especial, as declarações da vítima, informante e testemunha. A autoria atribuída aos réus é induvidosa”.
No caso do empresário alemão, a sentença frisa que restou comprovado “que o réu se prevaleceu das relações domésticas e de coabitação que tinha com a vítima para praticar o crime”, o que foi considerado agravante na dosimetria da pena.
Da sentença cabe recurso e somente após o trânsito em julgado (quando não é mais possível recorrer) é que a Justiça alemã poderá ser comunicada sobre a condenação do empresário pela Justiça amazonense.
Defesas
Na fase de instrução processual, a defesa do empresário alemão requereu a absolvição dele com base no artigo 386, incisos II, V e VII, do Código de Processo Penal; e subsidiariamente, a aplicação da pena no mínimo legal e a concessão do direito de recorrer em liberdade.
A defesa da mãe da vítima instaurou incidente de insanidade, mas em processo apartado, concluiu-se, por meio de Laudo Médico Psiquiátrico homologado em sentença, que a ré é inteiramente capaz de entender o caráter ilícito dos crimes imputados a ela. A defesa pediu pela absolvição e, de forma secundária, pela aplicação de pena mínima
A defesa do irmão da vítima pugnou pela absolvição deste. A defesa da tia requereu, em síntese, preliminarmente, a anulação do processo nos termos dos artigos 564, III e IV, do Código de Processo Penal, por violação do artigo 5.º, LIV e LV, da Constituição; e, no mérito, a absolvição da ré e, subsidiariamente, a aplicação da pena-base, a fixação de regime inicial mais brando e a concessão do direito de recorrer em liberdade.
Texto: Sandra Bezerra e Terezinha Torres
Foto: Marcus Phillipe
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